quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A Crise e o Mercado de Arte

É notório que em todo e qualquer mercado, quase tudo entre em colapso ao primeiro sinal de crise. A bolsa por sua vez despenca, o dólar dispara e o petróleo tem sua produção reduzida. Mas e o mercado de arte, como reage perante a crise?

Claro que como todos os outros, esse mercado inicialmente se retrai e o medo do investimento é perceptível. Seu risco é enorme, mas o risco negativo de uns é o risco positivo de outros.

O mercado de arte é delicado, suscetível a boatos, mas tem suas peculiaridades.

É um mercado que lida com algo absolutamente subjetivo, alguns até chegam a insinuar que o mercado de arte atua com o supérfluo do supérfluo, o que não é nem de perto verdade, mas respeitemos a opinião de todos. Sua subjetividade significa, simplesmente, o fato de lidar diretamente com o gosto. E gosto não se discute, no máximo se lamenta.

Independentemente de gostar ou não de um Di Cavalcante, de um Portinari ou de um Tunga, puramente pelo lado estético do objeto, temos o lado comercial do mercado que não tem ligação com o gosto. Os objetos são negócios, pois são adquiridos puramente para obtenção de lucro.

Benjamin Wallace, em seu mais recente livro O Vinho Mais Caro do Mundo, fala sobre o mercado de vinhos raros e suas falsificações. Nele há uma passagem interessantíssima sobre o lado comercial, fazendo uma analogia com caixas de sardinhas que eram vendidas sempre com lucros estratosféricos, todavia ninguém sabia o real gosto. Então um colecionador, resolve abrir uma lata e se depara com um gosto terrível. Este volta ao vendedor e reclama que as sardinhas são horríveis e escuta deste que as sardinhas são para ganhar dinheiro e não para serem comidas.

Acho esta passagem ideal para ilustrar o fato comercial do mercado de arte, seja ele que mercado for. Existem objetos que são cobiçadíssimos, que podem até ser ruins para alguns, mas se vendem pelo fato de valerem algum bom dinheiro.

Existem algumas figuras atuantes no mercado de arte que determinam sua volatilidade.

Temos o comerciante, o colecionador, o especulador e a figura do leiloeiro.

Não podemos esquecer que o leiloeiro é um vendedor acima de tudo. Há em São Paulo um famoso leiloeiro que, certa vez, me disse o seguinte:

“- Até o inicio do leilão eu posso te aconselhar no que você desejar, mas no momento em que eu inicio o pregão, eu quero vender pelo maior lance possível e vou fazer de tudo para tirar mais e mais do comprador.”

Naquele momento tive a certeza que ele estava agindo como um vendedor que quer sempre o mais do mais. Ou seja, ele na verdade como leiloeiro deixa de ser um conselheiro e se transforma num simples vendedor, que ganha sua comissão sobre a venda, logo, quanto mais ele tira do comprador, mais ele ganha. Em conseqüência disso, muitas vezes inflando o próprio valor do objeto oferecido no pregão.

Voltando à crise, é em tempos difíceis que muitas coisas mudam de mãos e nem sempre pelo mais do mais. Nesses momentos, os colecionadores abrem os olhos às possibilidades, mas se retraem com medo do risco negativo momentâneo. Os comerciantes precisam buscar liquidez para futuros negócios, e, neste momento, entra o especulador assumindo os riscos positivos da crise, tentando se aproveitar dos outros dois personagens desta trilogia anunciada.

Como o comerciante precisa de liquidez financeira, ele reduz o valor de suas obras para realizar as vendas. O especulador então assume sua posição voraz e compra as obras por um valor ainda mais baixo, pois paga em “cash”, dinheiro vivo, nota sobre nota.

Como é isso que o comerciante necessita, em virtude do momento, ele aceita reduzir mais ainda o valor. Esta atitude especulatória é assim no mercado de arte, na bolsa de valores ou em qualquer outro mercado aberto.

A partir de então, a figura do especulador toma dois caminhos: ou espera um reaquecimento do mercado em um futuro próximo ou procura o colecionador e oferece a obra acenando com um possível bom negócio, tendo em vista o valor baixo da aquisição. Cabe então ao colecionador assumir o risco da não compra ou se deleitar com a aquisição.

Se antes tínhamos o mercado aquecido com leilões realizados no Rio de Janeiro e em São Paulo, hoje temos um cenário diferente. O pregão terá que oferecer boas oportunidades de negócios para incentivar o público casual a entrar neste mercado vindo de outros.

Com isto, em plena crise, podemos ter um mercado de arte levemente aquecido com bons negócios trocando de mãos.

É como diz um amigo, uma figura ímpar do mercado:

“- Quando só temos calmaria, só aparecem peças medianas. Quando começa um vendaval, as peças de toda sorte aparecem, desde mais as comuns às mais raras e desejadas por ávidos colecionadores.”

Isto é tão verdade, que foi noticiado que a famosa casa de leilões Christie’s pretende abrir no Brasil sua vertente de negócios imobiliários. Esse ramo de negócio será apenas para imóveis acima das possibilidades dos mortais, mas que estão disponíveis para venda. Se esta casa secular vislumbrou esta oportunidade, e eles vêm d’além mar, é como diz o ditado, onde há fumaça há fogo.

Esperamos que 2009 seja um ano quente em todos os mercados, com riscos negativos e positivos. Cabe a nós assumir qual risco queremos abarcar.

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